China: a ascensão de uma nova potência mundial no século XXI

Nos últimos 30 anos, o Mundo observa um crescente avanço da República Popular da China. Esse progresso é constatado em múltiplos elementos, principalmente nos indicadores socioeconômicos e pelo papel geopolítico, cada vez maior, que o país asiático tem exercido na arena política mundial. Segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI), em 2000, o Produto Interno Bruto (PIB) chinês era de US$ 1 trilhão. Em 2022, esse valor foi para US$ 18 trilhões, colocando o país como a segunda maior economia do planeta. Este é apenas um dado, de vários, que utilizamos para ilustrar tal evolução.

O desenvolvimento, as conquistas e a envergadura geopolítica da China contemporânea são frutos de um profundo processo de reforma política e econômica chinesa entre os anos de 1970 e 1980.  As transformações na esfera política e econômica, promovida por Deng Xiaoping, Chen Yun e Zhao Ziyang – figuras importantes do Partido Comunista Chinês (PCCh) –, levaram o país de um comunismo centralizado para o chamado socialismo de mercado. As “modernizações” política e econômica dos chineses, no século passado, permitiram a integração econômica chinesa aos mercados globais através da “política de portas abertas” e a atração de inúmeras empresas estrangeiras para operarem nas chamadas Zonas Econômicas Especiais (ZEEs), inauguradas em 1980. Atualmente existem sete grandes ZEEs (Shenzhen, Zhuhai, Xiamen, Shantou, Hainan, Kashgar e Khorgas) e outras classificadas como Zonas de Desenvolvimento Econômico e Tecnológico Nacional, Zonas de Desenvolvimento Industrial de Alta Tecnologia, Zonas Piloto de Livre Comércio, State-level New Areas, Áreas Especiais de Fiscalização Aduaneira e Zonas de Cooperação Comercial Transfronteiriças.

A “política de portas abertas” proporcionou, pelo seu modelo de funcionamento, a abertura econômica, a liberalização do comércio exterior, o avanço tecnológico, o desenvolvimento e produção industrial em larga escala e a entrada de investimentos estrangeiros na China. Estes elementos foram importantes para o crescimento estável e organizado, por meio dos Planos Quinquenais, da economia chinesa, assim como, por alçá-la a posição de maior produtora industrial e consequentemente sua maior participação na estrutura econômica mundial ao longo dos séculos XX e XXI.

Desta maneira, na ótica dos dirigentes chineses, um país forte e estável no cenário interno era necessário para a construção de uma política externa robusta que permitisse que a China ocupasse o posto e exercesse o seu poder histórico, pela perspectiva do Confucionismo, de maior Nação do Mundo. A concepção deste desenvolvimento conjunto, dos cenários interno e externo, é a chave para a ideia da “ascensão pacífica” chinesa arquitetada especialmente durante o período da liderança política exercida por Hu Jintao, entre 2003 e 2013.

Tal ascensão pacífica é pautada por dois aspectos básicos: [a] o princípio básico das cinco regras de coexistência pacífica utilizado pela diplomacia chinesa desde meados dos anos 1950; [b] a criação de uma “comunidade de futuro compartilhado global”, onde todas as Nações, independente da sua força e tamanho, podem e devem ter o direito de participar das tomadas de decisões em assuntos de ordem mundial. Na perspectiva chinesa, questões globais não podem e não devem ser pautadas em resoluções feitas por um pequeno grupo de países ou blocos hegemônicos.

Além da coexistência pacífica e da comunidade global com futuro compartilhado, os chineses são adeptos do estabelecimento de acordos de cooperação benéficos para todas as partes envolvidas. Portanto, no último século, conforme a China progrediu internamente com a atração de capital externo, desenvolvimento industrial e o investimento massivo em educação, ciência, tecnologia, moradia e saúde, a demanda chinesa por recursos para atender o mercado externo aumentou significativamente.  

Para suprir as necessidades internas, a China utiliza uma audaciosa estratégia geopolítica que é a criação de redes de infraestrutura Mundo afora. Através da chamada “Nova Rota da Seda”, também conhecida por Belt and Road Initiative (BRI) ou 带路 (em mandarim, Yidaiyilu), os chineses têm desenvolvido, mediante a acordos de cooperação, corredores econômicos transnacionais manifestados fisicamente nos territórios por ferrovias, rodovias, portos, gasodutos, oleodutos e outros projetos de energia e transporte que ligam o território chinês a outros territórios fundamentais para atender às suas demandas.

Tais corredores, além de fornecerem os recursos necessários e básicos para a produção industrial chinesa, também são utilizados para o escoamento de produtos, fabricados em território chinês, aos principais mercados consumidores do Mundo. Portanto, a China simultaneamente detém uma elevada produção industrial em seu território, que basicamente atende a todos os mercados consumidores, e desenvolve novos circuitos de circulação do capital em que ela não terá o controle total, pois, são estruturas geograficamente posicionadas em outros territórios, mas que ela certamente irá exercer um grande poder.

Desta maneira, o exercício de poder, a contestação e a relevância chinesa no cenário político e econômico mundial atual, são frutos de estratégias desenvolvimentistas meticulosamente pensadas para promover o progresso interno e externo, que devem ter limites, metas e objetivos. Tais estratégias ocorrem, em um primeiro momento, ainda no século XX, com a “política de portas abertas” e o processo de abertura econômica chinesa, abrigando empresas e o capital estrangeiro. Esses métodos de evolução econômico e político são reforçados com ascensão pacífica chinesa e o progresso socioeconômico que o país acumula desde, pelo menos, a primeira década deste século. É esta lógica, de crescimento multiescalar, de respeito à soberania e a promoção de política externa multilateral e pragmática, que garantem à China a sua centralidade cada vez maior no século XXI.

  • Leituras sugeridas

JABBOUR, E. GABRIELLE, A. China: o socialismo do século XXI. São Paulo: Boitempo, 2021.   

SANTOS, J. C. China na Ásia Central e a cooperação como código geopolítico. 2022. 163 f. Dissertação (Mestrado em Geografia) – Programa de Pós-Graduação em Geografia, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Seropédica/Nova Iguaçu, RJ, 2022.

  • Sobre o autor

Jonathan é graduado e mestre em Geografia pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro.

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